Adicional de transferência. O Gato de Schroedinger e as peculiaridades do tema perante a jurisprudência do TST

Por Mozart Victor Russomano Neto

1 INTRODUÇÃO
O que o “Gato de Schroedinger” e o adicional de transferência têm em comum?

Neste artigo, busca-se apresentar, ainda que de forma superficial, aspectos sobre como o Tribunal Superior do Trabalho vem julgando o direito ao percebimento do adicional de transferência e, por meio daqueles, dar foco à atual problemática relativa ao adicional em questão.

O experimento denominado “Gato de Schroedinger” exemplifica de forma ímpar o maior problema que se apresenta quando da análise do tema pelo Poder Judiciário. Por meio de uma simples comparação, buscar-se-á transmitir ao leitor uma noção mais precisa do que é necessário para configurar o direito ao adicional de transferência e, concomitantemente, sugerir soluções para alguns aspectos que se entende ensejadores de insegurança jurídica.

Para tanto, primeiramente, torna-se necessário explicar, em breve parágrafo, o que é o experimento denominado “Gato de Schroedinger”.

A hipótese do “Gato de Schroedinger” foi concebida pelo físico austríaco Erwin Schroedinger, no século XX, e teve como intenção exemplificar de forma simples o comportamento aleatório de partículas subatômicas, ante o princípio da incerteza.

No experimento, um gato é deixado dentro de uma caixa com um medidor Geiger, um martelo sobre um recipiente com veneno e partículas radioativas que podem ou não circular no ambiente. Se a substância decair, o medidor Geiger aciona o martelo, que quebra o frasco de veneno, matando, assim, o gato; caso não decaia, o gato vive. Como o observador, de fora da caixa, não tem conhecimento sobre o fato de a substância radioativa ter decaído ou não, não há como afirmar que o gato esteja vivo ou morto até que a caixa seja aberta. Assim, deve-se presumir que, enquanto a caixa está fechada, o gato está tanto vivo quanto morto, ao mesmo tempo.

O experimento não possui, diretamente, qualquer relação com o adicional de transferência. Contudo, ao fim deste artigo, buscar-se-á demonstrar que o direito a este adicional está atrelado a uma análise posterior da situação pela qual passou o trabalhador. Em outras palavras, até que certos elementos fáticos estejam presentes, não há como afirmar se um empregado transferido tem direito ao adicional de transferência ou não.

Assim, propõe-se um aprofundamento nos aspectos jurídicos relevantes para a análise ao direito ao adicional de transferência para, em continuidade, verificar se há como evitar esta reportada insegurança jurídica.

 

2 O ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA

2.1  Conceito e finalidade
O adicional de transferência encontra-se disciplinado no artigo 469 da CLT, que, em sua integralidade, assim dispõe:

Art. 469 – Ao empregador é vedado transferir o empregado, sem a sua anuência, para localidade diversa da que resultar do contrato, não se considerando transferência a que não acarretar necessariamente a mudança do seu domicílio.

§ 1º – Não estão compreendidos na proibição deste artigo: os empregados que exerçam cargo de confiança e aqueles cujos contratos tenham como condição, implícita ou explícita, a transferência, quando esta decorra de real necessidade de serviço.

§ 2º – É licita a transferência quando ocorrer extinção do estabelecimento em que trabalhar o empregado.

 § 3º – Em caso de necessidade de serviço o empregador poderá transferir o empregado para localidade diversa da que resultar do contrato, não obstante as restrições do artigo anterior, mas, nesse caso, ficará obrigado a um pagamento suplementar, nunca inferior a 25% (vinte e cinco por cento) dos salários que o empregado percebia naquela localidade, enquanto durar essa situação.

Interpretando o § 3° da aludida norma legal, o TST redigiu em 1997 a Orientação Jurisprudencial n° 113 da SBDI-1, transcrita abaixo.

113. ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. CARGO DE CONFIANÇA OU PREVISÃO CONTRATUAL DE TRANSFERÊNCIA. DEVIDO. DESDE QUE A TRANSFERÊNCIA SEJA PROVISÓRIA.

O fato de o empregado exercer cargo de confiança ou a existência de previsão de transferência no contrato de trabalho não exclui o direito ao adicional. O pressuposto legal apto a legitimar a percepção do mencionado adicional é a transferência provisória.

Diante destes dois elementos jurídicos, o TST vem evoluindo sua jurisprudência sobre o assunto até os dias de hoje, alterando tanto a noção do que caracteriza uma transferência provisória quanto os aspectos fáticos que permitem configurar a transitoriedade ou definitividade dos atos estudados.
O intuito da norma, contudo, não se alterou ao longo do tempo. Ainda há, com o pagamento do adicional de transferência, a tentativa de afastar do trabalhador transferido as despesas adicionais e decorrentes da sua mudança de domicílio e da moradia em local distante de sua origem. É por este motivo, portanto, que o adicional de transferência não é devido quando não há alteração no domicílio do obreiro ou quando a transferência é definitiva, já que o custo em questão seria diluído com o passar do tempo e acabaria se tornando, à medida que o trabalhador fixa novo domicílio, despesa ordinária.

O ponto nodal da questão, destarte, reside no conceito daquilo que configuraria uma transferência provisória. Abaixo, tentar-se-á destrinchar os fatos que, prequestionados nos autos, levam o TST a se posicionar sobre as transferências e suas respectivas naturezas, apresentando jurisprudências recentes que exemplificam o raciocínio atual daquela Corte Superior.

 

2.2 Elementos que afastam ou comprovam o direito ao adicional de transferência
O principal aspecto a se analisar para determinar a definitividade de uma transferência é, sem dúvida alguma, o próprio tempo decorrido do ato. Este seria a pedra de toque e, na maioria dos casos, o único elemento verificado para se definir a natureza da transferência.

O TST possuiu, por vários anos, o entendimento de que a transferência provisória seria aquela que perdura por menos de dois anos. Ultrapassado este marco temporal, o ato seria definitivo, não havendo direito ao adicional de transferência.

Contudo, não obstante o prazo de dois anos ainda seja utilizado por alguns Tribunais Regionais, nos últimos anos o TST tem, de forma pacífica, aplicado o prazo de três anos para distinguir transferências definitivas e provisórias. Não há, atualmente, nenhum órgão do Tribunal Superior do Trabalho que utilize critério temporal distinto, superior ou inferior a três anos.

ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. DEFINITIVIDADE. NÃO CONHECIMENTO. I. Depreende-se do acórdão que a Corte de origem manteve a sentença em que foi afastado o pleito de pagamento de adicional de transferência, ao fundamento de que “é evidente o caráter definitivo da transferência” do Reclamante. Nesse sentido, foi consignado na decisão que “o reclamante foi contratado em 1990 na cidade de Londrina/PR, tendo sido transferido para a cidade de Cambará/PR neste mesmo ano e em 2002 para a cidade de Ivaiporã/PR, onde permaneceu até a rescisão contratual ocorrida em 2012”. II. Sobre o tema, a Orientação Jurisprudencial nº 113 da SBDI-1 do TST consagra o entendimento de que o adicional de transferência é cabível apenas na hipótese de mudança provisória. III. Para fins de aplicação do referido precedente jurisprudencial, esta Corte Superior tem decidido que, a princípio, transferências sucessivas com duração inferior a três anos não devem ser qualificadas como definitivas, mas sim provisórias. Julgados. IV. Portanto, a partir da jurisprudência desta Corte Superior, é definitiva a transferência ocorrida entre 2002 e 2012, com duração superior a três anos, o que afasta o direito do Autor ao adicional de transferência. Assim, verifica-se que a decisão recorrida está em harmonia com a jurisprudência dominante no âmbito desta Corte Superior, razão pela qual é inviável o processamento do recurso de revista sobre a matéria, quer por divergência jurisprudencial, quer por violação de lei federal ou da Constituição da República, nos termos do art. 896, § 7º, da CLT e da Súmula nº 333 do TST. V. Recurso de revista de que não se conhece. 7. (RR – 8-58.2012.5.09.0073 , Relator Ministro: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 26/06/2019, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 28/06/2019)

RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. PERÍODO SUPERIOR A TRÊS ANOS. DEFINITIVIDADE. A jurisprudência desta Corte, atenta ao princípio da razoabilidade, a fim de mensurar o que representa a provisoriedade nos casos de transferência, entende caracterizada quando ela se dá por um período inferior a 3 (três) anos. Na hipótese dos autos, o TRT constatou que o período de transferência do autor foi muito superior a três anos, perdurando de 1°/12/2003 até a rescisão do contrato de trabalho, ocorrida em 8/8/2012. Dessa forma, não se vislumbra provisoriedade, mas definitividade, encontrando-se a decisão regional em conformidade com a OJ-113-SBDI-1/TST, atraindo o óbice do artigo 896, § 7º, da CLT e da Súmula 333/TST, a inviabilizar a pretensão recursal. Recurso de revista não conhecido. (ARR – 635-97.2014.5.09.0071 , Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 08/05/2019, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 10/05/2019)

Ademais, divide a atenção dos julgadores outro elemento que pode ou não configurar a definitividade dos atos: a quantidade de transferências ocorridas e a duração do contrato de trabalho. Tal conceito ganha o nome de sucessividade.

Não há, no TST, um consenso sobre o número de transferências e a duração destas que possa traçar uma linha bem definida sobre o que pode ou não caracterizá-las como definitivas ou provisórias. Contudo, é possível verificar que qualquer número superior a duas transferências durante o contrato de trabalho já enseja o risco de enquadrá-las, todas elas, como provisórias, ainda que estas tenham durado mais do que três anos, cada uma.

Para se evitar a caracterização de transferências sucessivas, busca-se prequestionar que estas ocorreram durante contratos de trabalho prolongados no tempo, perpassando vários anos, quiçá décadas.

ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. SUCESSIVIDADE E PROVISORIEDADE. O caráter da transferência, se provisória ou definitiva, por sua vez, é aferido levando-se em conta algumas variáveis entre as quais ganha destaque, no caso concreto, a sucessividade das transferências. O Colegiado registrou o contexto fático presente no acórdão regional dando conta da existência de sucessivas transferências durante o contrato de trabalho. Ficou, ainda, incontroverso terem ocorrido doze transferências enquanto perdurou o contrato laboral. Mesmo que a única transferência ocorrida no período imprescrito tenha excedido três anos, certo é que houve mais de uma transferência, em que o reclamante permaneceu nas localidades por um ano ou dois. Nesse mote, convém destacar que os dados fáticos devem ser analisados em conjunto, não bastando o exame de um único fator, como o tempo, mas sim a conjugação de vários requisitos: o ânimo (provisório ou definitivo), a sucessividade de transferências e o tempo de duração. Assim, demonstrada a sucessividade nas transferências, ainda que no período alcançado pela prescrição, não há como se furtar à configuração da provisoriedade daquela ocorrida no período imprescrito, mesmo que esta tenha sido por tempo superior a três anos. Recurso de embargos conhecido e provido. (AgR-E-ED-Ag-ED-RR – 997-67.2012.5.09.0072 , Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 24/08/2017, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 08/09/2017)

ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. DURAÇÃO. TRANSFERÊNCIAS SUCESSIVAS. PROVISORIEDADE. Configura-se a hipótese de transferências sucessivas, pois após três anos de labor no local da contratação, ocorreram oito transferências no intervalo de vinte e dois anos, circunstância que retira o caráter definitivo da última delas, ainda que haja perdurado por ao menos seis anos até o ajuizamento da reclamação, de forma que em relação a tal período, observada a prescrição quinquenal pronunciada na sentença, é devido ao empregado o adicional de transferência na forma da OJ 113 da SbDI-1 do TST. Embargos de que se conhece e a que se dá provimento. (E-RR – 1486-27.2011.5.09.0012 , Relator Ministro: Márcio Eurico Vitral Amaro, Data de Julgamento: 18/02/2016, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 26/02/2016)

Ainda relativamente ao conceito de sucessividade, é importante notar que, enquanto a existência de várias transferências é capaz de transformar atos superiores a três anos em provisórios, ensejando, portanto, o pagamento do adicional em comento, o fato de ter havido uma única transferência não possui o condão de configurar sua definitividade, caso não haja o decurso de pelo menos três anos.

Por fim, há, também, a necessidade de se verificar se houve promoção a justificar a mudança de domicílio do empregado. O fato de a transferência ter ocorrido em virtude de promoção pode servir, regra geral, para caracterizá-la como definitiva, eis que, por meio de um raciocínio básico, chega-se à conclusão de que uma transferência ocorrida por promoção não é, via de regra, provisória, pois a ascendência hierárquica do empregado seria, por sua natureza, também definitiva.

ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. TRANSFERÊNCIA EM FACE DE PROMOÇÃO DO EMPREGADO. 1. Esta Corte superior, por meio da Orientação Jurisprudencial n.º 113 da SBDI-I, sedimentou entendimento no sentido de que o caráter provisório da transferência constitui requisito necessário para o deferimento do respectivo adicional. 2. Ficou registrado no acórdão recorrido que a transferência do reclamante se dera em razão da sua promoção funcional e de forma definitiva. Indevido, pois, nessa circunstância, o pagamento do adicional. 3. Recurso de revista conhecido e provido. (RR – 17900-07.2009.5.09.0195 , Relator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, Data de Julgamento: 29/10/2014, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/10/2014)

Entretanto, releva notar que o mero registro de que a transferência se deu por promoção, desvinculado do tempo decorrido e da quantidade de mudanças anteriores, não é aconselhado, pois o entendimento supracitado não é pacífico em todas as Turmas do TST. A existência de transferência decorrente de promoção, mas inferior a três anos, por exemplo, pode configurar o ato como provisório. Recomenda-se, assim, que tal elemento fático seja prequestionado sempre que possível, mas juntamente com os outros elementos acima reportados.

 

2.3 Elementos relativamente irrelevantes à análise ao direito ao adicional de transferência.
Além dos elementos acima tratados, há diversos outros que podem servir de base ao convencimento do magistrado quanto à definitividade ou à transitoriedade do ato. Entretanto, a sua maioria não surte, de forma autônoma, efeitos concretos diante da análise dos Ministros do TST, embora desenvolva importante papel secundário para corroborar a natureza da transferência, sempre que possível.

Aspectos como o exercício de cargo de confiança pelo empregado transferido ou a existência de previsão de transferência no contrato de trabalho já são, há décadas, tidos como inócuos para configurar a definitividade do ato. A própria Orientação Jurisprudencial n° 113 da SBDI-1 do TST, já transcrita acima e muito utilizada para fins de admissibilidade recursal no tema, teve sua origem exatamente para afastar esta hipótese.

Outros elementos, menos explorados, ainda podem ser prequestionados com o objetivo de tentar convencer o julgador acerca de uma tese ou de outra, dentre os quais se destaca o local de ajuizamento da reclamação trabalhista.

Não é incomum se deparar com processo envolvendo pleito de adicional de transferência em que o autor, já desligado da empresa reclamada, informa estar residindo ainda no local para o qual foi transferido. Usualmente, esta informação vem acompanhada do protocolo da ação na Vara do Trabalho do município de sua residência.

Este registro, por si só, não é suficiente para comprovar a definitividade da transferência. Contudo, diante de quadros dúbios, como aqueles que apresentam três ou quatro transferências e nos quais se discute se a última seria definitiva ou se haveria sucessividade de atos, o fato de o reclamante permanecer com domicílio no local para o qual foi transferido serve para corroborar a natureza absoluta da transferência.

Da mesma forma, o retorno do trabalhador ao domicílio de origem serve para auxiliar a comprovação da transitoriedade da transferência.

Apesar deste elemento fático ser próprio dos autos e, em tese, não requerer prequestionamento à luz da Súmula 297 do TST, é comum que os julgadores ignorem este aspecto caso não haja manifestação expressa pelo acórdão recorrido ou pelo próprio recorrente. Recomenda-se, assim, sempre que possível, que haja seu prequestionamento explícito.

Por fim, também não há falar em definitividade da transferência simplesmente porque esta perdurou até o fim do contrato de trabalho. Caso o vínculo tenha se encerrado enquanto ocorrida a transferência, a natureza desta será analisada com base no período decorrido até o desligamento.

 

ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 113 DA SBDI-1 DO TST. CONTRATO DE TRABALHO VIGENTE POR TRINTA ANOS. EMPREGADO TRANSFERIDO DUAS VEZES. A PRIMEIRA POR DOIS ANOS E A SEGUNDA POR QUATRO MESES, ONDE PERMANECEU ATÉ A RESCISÃO CONTRATUAL. CARACTERIZAÇÃO DA SUCESSIVIDADE. PARCELA DEVIDA. Consta do acórdão embargado que o reclamante foi empregado de 8/2/1973 a 2/6/2003 (trinta anos). A primeira transferência ocorreu em fevereiro/2001, durou dois anos (até fevereiro/2003), e a segunda ocorreu de fevereiro/2003 até a rescisão contratual (junho/2003) e durou apenas quatro meses. A Turma consignou que a primeira transferência, com interregno de dois anos, foi provisória, e a segunda transferência, a despeito de ter durado apenas quatro meses, foi tida por definitiva, por ser a derradeira, tendo o reclamante ali permanecido até a rescisão contratual. No caso dos autos, a fundamentação da Turma para considerar definitiva a última transferência, a despeito do exíguo interregno (quatro meses), foi a impossibilidade de outra transferência com a qual se pudesse indagar da sua provisoriedade. Esta Corte superior, interpretando o artigo 469 da CLT, editou a Orientação Jurisprudencial nº 113 da SbDI-1 do TST, a qual tem o seguinte teor: “ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. CARGO DE CONFIANÇA OU PREVISÃO CONTRATUAL DE TRANSFERÊNCIA. DEVIDO. DESDE QUE A TRANSFERÊNCIA SEJA PROVISÓRIA. O fato de o empregado exercer cargo de confiança ou a existência de previsão de transferência no contrato de trabalho não exclui o direito ao adicional. O pressuposto legal apto a legitimar a percepção do mencionado adicional é a transferência provisória”. O entendimento desta Corte superior, externado por seu órgão uniformizador de jurisprudência interna corporis, a SbDI-1, em observância a essa Orientação, segue no sentido de que a existência de consecutivas transferências ocorridas no curso do contrato de trabalho evidenciam a sua provisoriedade, não obstante o lapso temporal havido entre elas. O fundamento da Turma de que a transferência, apesar da curta duração, tem necessariamente o caráter definitivo se culmina na dissolução do contrato de trabalho não subsiste porque destoa do entendimento prevalecente no âmbito desta Corte uniformizadora de jurisprudência. No caso concreto, caracterizada está a sucessividade nas transferências (duas transferências sequenciais no período imprescrito e nenhuma delas ultrapassou o período de dois anos), ao passo que a redação da Orientação Jurisprudencial nº 113 da SbDI-1 do TST não faz distinção quanto à última transferência, nem estabelece que o período derradeiro seja o fator decisivo. Embargos conhecidos e providos. (E-E-ED-RR – 193300-82.2003.5.03.0075 , Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 23/03/2017, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 11/04/2017)

 

3 CONCLUSÃO
Presentes os elementos acima tratados, haverá uma confortável segurança de que a análise ao direito ao adicional de transferência, pela mais alta Corte trabalhista pátria, será feita de forma integral. O advogado que se aprofundar nos processos envolvendo o supracitado tema deverá buscar prequestionar – ou não – tais aspectos fáticos, levando em conta seu interesse na configuração de definitividade ou transitoriedade das transferências ocorridas com o empregado autor de reclamação trabalhista.

Contudo, em que pese restar virtualmente completo o “tour” pelos fatos relevantes para o direito ao adicional de transferência, ainda resta comparar sua análise atual pelo Poder Judiciário com o experimento “Gato de Schroedinger”, como prometido na introdução deste artigo.

De fato, o último aspecto abordado exemplifica, de forma ímpar, a dificuldade que se tem de definir a natureza da transferência antes que haja o cumprimento de uma série de condições factuais, fadadas a análises futuras.

Exemplifica-se: indaga-se ao empregado transferido há 12 meses se este ato, que ainda se mantém, seria definitivo ou provisório. A resposta de qualquer um, naquele momento, somente poder ser “não sei”. Isto porque a transferência – caso seja somente uma neste exemplo dado – pode ser definitiva, caso perdure por pelo menos mais 24 meses, ou provisória, caso se encerre em momento anterior.

Enquanto a transferência estiver ocorrendo, ela é tanto definitiva quanto provisória, da mesma forma que o gato do citado experimento está, concomitantemente, vivo e morto.

Obviamente, esta resposta gera inequívoca insegurança jurídica e prejudica tanto empregados quanto empresas, pois o pagamento a um direito trabalhista está sendo condicionado a evento futuro e incerto. O empregado pode ficar sem receber o devido adicional, pois a empresa acredita ser definitiva a transferência; ou o empregador pode sofrer condenação em reclamação trabalhista posterior, pois o encerramento precoce do contrato ou da transferência transformou-a em provisória, ainda que este não tenha sido o objetivo inicial.

Diante deste cenário, torna-se necessário regressar ao objetivo precípuo do adicional de transferência: custear as despesas extraordinárias decorrentes dos primeiros meses após a mudança de domicílio do empregado.

Desta forma, acredita-se que o ideal seria que o adicional em testilha fosse devido sempre que houvesse transferência, independentemente de sua duração. Não obstante, o seu pagamento estaria limitado a um período máximo, já que, após tal período, as despesas já seriam ordinárias, decorrentes da rotina comum do empregado e não mais originárias da mudança na vida do trabalhador.

Como recomendação, entende-se que a transferência seria provisória sempre em seus primeiros seis meses, tornando-se definitiva a partir do sétimo mês, não importando o que acontecesse posteriormente.

Tal solução resolveria os problemas relativos a praticamente todos os casos, pois aqueles funcionários regularmente transferidos teriam a garantia de receber o adicional nos primeiros seis meses de cada ato; já as empresas teriam a segurança de que o adicional seria devido sempre por um período fixo. Desse modo, na hipótese de o empregado, transferido com intuito definitivo, ter de se desligar um ano após o ato, não haveria valores financeiros a serem despendidos por decorrência de evento futuro e que foge aos interesses da empresa. Por fim, a maior previsibilidade e segurança jurídica para todas as partes reduziriam o número de ações trabalhistas.

Como se vê, há muito o que se pode extrair de situações que, em princípio, parecem não dizer respeito ao mundo jurídico, como o “Gato de Schroedinger”.